Começamos a existir Naquele Sonho que faz realidade todos os outros, derramando o Seu amor, através do amor de dois seres humanos, e, no milagre da vida, descobri-mo-nos capazes de pensar, de amar, de chorar, mas também de sorrir. Misturando este sonho, agitado pela vida, assim pensamos... e do pensar a letra se faz, e da Palavra se recomeça de novo, como na Origem.

24 julho 2009

Afinal ele está connosco!

Deus acompanha-nos. Com a multiplicação dos pães, Jesus revela que Deus está atento à nossa vida humana ordinária e quotidiana. Já no domingo passado o Ev chamava a atenção para o olhar de Jesus sobre a multidão: ao ver uma grande multidão compadeceu-se dela porque eram como ovelhas sem pastor, e começou a ensiná-los. O essencial para todos nós é encontrar, hoje, ou cada dia, a resposta à nossa necessidade de saber, de conhecer, para dar-mos um sentido à nossa vida, a toda a nossa vida. Jesus ensina a multidão dos que acorrem até ele. Tanto ou tão pouco que eles acabam por passar um dia inteiro, sem se aperceberem, e ao cair da noite, era tarde para ir procurar alimento às aldeias à volta, casais e quintas. Este é o quadro de continuidade que o Ev hoje nos apresenta. Por um momento parece que o Evangelho e o próprio Jesus se tornam realistas, se podemos considerar assim. Ele tinha dado prioridade a ensinar a Palavra, ao alimento espiritual, mas reconhece também a situação em que a multidão se encontra. E novamente é ele que toma a iniciativa, e pergunta a Filipe: «Onde havemos de comprar pão para lhes dar de comer?» A resposta é também realista: o salário de duzentos dias de trabalho não dava para alimentar aquela multidão. Eles não tinham meios para tanto.
O Homem acompanha Deus. Jesus revela-nos o verdadeiro rosto de Deus, que através do seu Filho alimenta a multidão. Mas Deus requer a participação do homem. Espera de nós que sejamos sinceros e demos o que temos. Tem necessidade da nossa ajuda, mesmo se for insignificante, mas sincera. Não pode, ou não quer, fazer o milagre a partir do nada. «Um rapaz, cinco pães e dois peixes». Nem sequer é a partir da fé dos apóstolos. Deus nem nos substitui, nem se substitui a nós. Confia-nos a tarefa de fazer acreditar e multiplicar os seus próprios dons que se tornam assim dons nossos. Acabamos por reconhecer ao mesmo tempo os nossos limites, mas também a nossa grandeza em colaborarmos com a nossa acção na obra de Deus. Assim aconteceu com Eliseu na 1ª leitura que diz ao servo para alimentar as gentes, mesmo se eram poucos pães para tanta gente. Mas cumpriu-se o que o Senhor disse: comerão e ainda há-de sobrar. E assim foi. Mas também nós hoje podemos fazer o mesmo: em vez de procurar culpar Deus pelo mal que há no mundo, dar-mos as nossas mãos pelas grandes causas, como pelas pequenas. Ajudando quem sofre longe, ou perto, mesmo ao nosso lado. Dando do nosso pão e dos nossos peixes. O milagre é tarefa de Deus, mas também passa pelas nossas mãos. E porque muito amámos muito nos será perdoado.
Deus acompanha-nos. Quando ficaram saciados, quando o milagre se tinha realizado, a multidão espantada, reflecte no que tinha acontecido. Não pensa nos doze cestos que sobram, e no que quereria dizer isso, nem no número dos pães e dos peixes. A conclusão foi mais transcendente e ao mesmo tempo a mais normal: «Este era na verdade o profeta que estava para vir ao mundo». Então Jesus retira-se. Ele sabe que o queriam reter, que o queriam fazer rei. E retira-se porque não quer que nos detenhamos no milagre materialmente falando: muito pão, mais que o necessário, sem dinheiro. Nem noutra qualquer significação espiritual que não seja a de quem descobre o Coração do próprio Deus, que nos ama e sabe que nós, homens e mulheres, também hoje neste tempo, não vivemos só de pão. Por isso é que antes de alimentar a multidão, os instrui longamente. E depois retira-se sozinho, para o monte. Parece que tudo termina. Jesus não veio resolver a fome do mundo, nem naquele tempo, nem neste. Mesmo que ele tenha matado a fome àqueles, e hoje a nós, espiritualmente falando, somos nós, homens e mulheres, que temos de matar a fome aos nossos irmãos que sofrem. Veio para nos lembrar o essencial: «vinde e vede». Não é por causa dos pães e dos peixes que temos de O seguir. É pela Palavra que ele nos dá. A mesma que Ele foi enviado a anunciar, a mesma que hoje nos diz. E que somos de novo chamados a anunciar. A nossa vocação, como nos recorda Paulo, é a de sermos chamados a uma só esperança: Ele que está perto de quantos o invocam (Salmo), um só Deus e Pai de todos, que embora estando acima de todos, actua em todos, e em todos se encontra.
O Senhor nos torne conscientes de tudo isto e nos mova o coração, e os braços, para sermos hoje o milagre de Deus no meio do mundo, que de novo quer saciar todos os homens e mulheres com o Pão da vida, Jesus Cristo, a Palavra de Deus ao mundo em que vivemos, que nos garante que Deus não nos abandona, antes nos acompanha, ao ponto de dar a vida por nós. Ámen.

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