Começamos a existir Naquele Sonho que faz realidade todos os outros, derramando o Seu amor, através do amor de dois seres humanos, e, no milagre da vida, descobri-mo-nos capazes de pensar, de amar, de chorar, mas também de sorrir. Misturando este sonho, agitado pela vida, assim pensamos... e do pensar a letra se faz, e da Palavra se recomeça de novo, como na Origem.

30 janeiro 2010

Charitas Christi urget nos...

No domingo passado Jesus era-nos apresentado como o Cristo, o ungido por Deus para anunciar a boa nova aos pobres, a libertação aos cativos, para proclamar o tempo favorável do nosso Deus. Esta escolha, como a de cada um de nós, que pelo Baptismo somos sacerdotes, profetas e reis em Jesus Cristo, aconteceu «antes de sermos formados no ventre materno», isto é, desde sempre. É o Senhor quem nos faz anunciar «o que Ele nos ordenar». O profeta por excelência, à imagem do qual somos profetas é o próprio Jesus Cristo, à luz do qual entendemos estas palavras do profeta Jeremias. E como Jeremias, como Jesus, como Paulo, somos enviados a anunciar um caminho de perfeição que ultrapassa tudo. Mas desde logo Jesus nos previne: «nenhum profeta é bem recebido na sua própria terra». E dá dois exemplos. Elias e Eliseu. O simples facto de recordar acontecimentos passados, para fazer perceber o presente, desperta a fúria dos ouvintes de Jesus. E este Jesus que Deus envia ao Seu Povo, este menino que há pouco contemplava-mos como dom de Deus para nós, é agora homem, que é expulso para fora da cidade. Já tinha nascido fora, mas para que não restassem dúvidas, até da sua própria terra foi expulso. Levado para fora da cidade. Não foi a primeira e não foi a última. Desde já Lucas prefigura qual o desfecho deste caminho que Jesus segue. Será também fora da cidade que há-de ser crucificado e sepultado. Não demorou muito a que Deus fosse rejeitado pelos homens. Se bem que todos se admiravam das suas palavras, todos são novamente os que ficam furiosos. O Profeta, aquele que não se anuncia a si mesmo, mas à Palavra de Deus, não é compreendido imediatamente. E pese embora o seu anúncio de libertação, de salvação, que inicialmente atrai, bem depressa se converte em escândalo para os seus ouvintes. Foi assim com Jesus, Ele próprio nos disse que haveria de ser assim connosco. Porém Jesus não desistiu de anunciar esse caminho de perfeição que ultrapassa tudo. E a nós também nos deve mover a caridade de Cristo. Porque é essa mesma a que dá sentido a tudo o que dizemos e fazemos. Pouco importa falarmos línguas, dos homens ou dos anjos, das coisas da nossa realidade, ou da vida que esperamos, sem caridade. Porque seremos sempre aparentemente robustos, e na realidade ocos, vazios. De nada nos serve anunciar, ou porventura ter grandes conhecimentos, ou até termos fé, porque sem caridade, sem o mesmo amor que Deus nos manifestou em Cristo Jesus, nada somos. Mas essa caridade não é apenas a que brota do exterior, que até nos pode levar a dar tudo o que temos, mesmo anulando quem somos. A nossa caridade tem de ser a de Jesus Cristo: paciente, benigna, alegre com a verdade, pronta a desculpar tudo, a tudo crer, tudo esperar, tudo suportar. Então ela não acabará nunca. E mais ou menos perfeita, à Luz Daquele que é perfeito, todas as imperfeições serão purificadas. E quando Ele quiser também nós conheceremos como somos conhecidos. Antes, porém, temos de tomar consciência de que somos comunidade profética, para anunciarmos como Jesus a Palavra do Pai, servirmos à libertação dos pobres e marginalizados aqui e agora. E então poderemos dizer «vi Aquele que me vê», porque o seu amor bondoso e o seu perdão misericordioso em nós mostraram outro: Jesus. Diante de todos, se assim procedermos, é Deus quem nos coloca: poderão combater contra nós, como fizeram com Jesus, mas não poderão vencer-nos porque Deus está connosco para nos salvar. E esse é um caminho de perfeição que ultrapassa tudo. O amor é a profecia que por excelência temos de anunciar, mais ainda, é a palavra que se faz caminho a seguir. Jesus passou pelo meio deles e seguiu o seu caminho. Hoje de novo passa pelo meio de nós. E nós, estaremos decididos a seguir o Seu caminho?

28 janeiro 2010

Os dias que correm

Procuramos tantas vezes sentido para o que nos acontece que muito provavelmente ficamos muito distantes do que nos acontece. Não vemos oportunidades nas dificuldades que nos aparecem, e muito provavelmente ficamos circundados de montes e colinas que os nossos olhos deixam de contemplar, para ficarem cravados no chão em vez de olharmos para cima, deixando que o azul que está mais alto, fique apenas negro...
Em vez de trabalharmos, ficamos parados na crise. Em vez de arregaçar mangas, acabamos por fielmente aconchegar as últimas camisas que temos passadas a ferro. Em vez de nos alegrarmos por estarmos vivos, lamentamos a passividade com que agarramos os problemas. Tantos e tantos exemplos. Cada um de nós tem os seus. E quem dera que soubessemos encontrar sempre a oportunidade que negamos. Temos sempre a Palavra de Alguém que prometeu estar quando tudo falha, que prometeu libertação, que prometeu ficar connosco, que prometeu receber-nos um dia, que até veio até nós, que continua a vir. Mas quantas vezes olhamos apenas para as palavras?! Por outro lado, era melhor também podermos usá-las para ripostar, gritar, procurar, pensar...
Somos estes seres estranhos, que tão depressa olhamos do fundo do poço, como nos sentimos nas alturas, ou ainda decidimos construir pontes e derrubar muros. Felizmente também somos seres animados pensantes, e de novo conseguimos interrogar a Resposta Daquele que nos vê.

20 janeiro 2010

Uma pausa nos dias que correm... para rezar!

Cristo Ressuscitado,
como caminhaste com os dois que viajavam pela estrada de Emaús,
vem conosco em nossa jornada de fé.
Nos encontros que tivermos pelo caminho,
dá-nos compaixão para ouvir a história do outro,
paciência para explicar o que pode parecer óbvio para nós,
e a coragem para nos tornarmos vulneráveis,
para que outros possam encontrar-te através de nós
e nos possamos redescobrir-te através deles.
Amén.
(Lindsey Sanderson, subsídios da Escócia para a Semana da Unidade dos Cristãos, disponíveis em vatican.va)

06 janeiro 2010

Novo diário (1) Ano novo, a mesma vida

Ano novo, a mesma vida, nova tentativa de escrever este post, sem que o computador vá abaixo… Hoje foi dia de retomar o trabalho. Não porque o tivesse deixado, mas porque estive ocupado com outros trabalhos. Também não foram férias, à parte de não haver aulas para preparar, nem aulas para dar. Fiquei contente por ter terminado um trabalho que comecei em um ano e seis meses atrás. Quem dera já não ter de lhe voltar a tomar o sabor, mas claro, falta o ponto final. Porém nem só de retomas de aulas foi o dia. Antes disso já tinha retomado a estrada, as curvas, os telefonemas durante o caminho, o cumprimento do código da estrada, prudentemente verificado por duas brigadas que me saudaram… Andei pela primeira vez a pé sozinho numa distância mais considerável, cá nas bandas, e senti o frio do tempo, na cara, o calor das pessoas que encontrei, no coração, e o céu a ameaçar neve, que agora se veio revelar zangada connosco, ou mais vulgarmente, que foi comida pelo nevoeiro.

Também foi uma oportunidade para rever o horário e plano de vida. Sim, um verdadeiro documento ‘gráfico’ onde tenho distribuídos tempos, momentos, e formas de andar p’ra frente… Deu-me o riso com alguns dos meus objectivos, e atrevo-me a partilhá-los. O primeiro é o cumprimento diário do horário e plano semanal. Diariamente é suposto seguir uma catrefada de planos, marcações e coisas do género. Para uma ideia mordaz da questão diariamente tenho cerca de 9h atribuídas a um possível sono, 7h30 para trabalho, estudo e coisas afins, 3h de oração litúrgica e pessoal, e 4h30m para refeições, higiene e tempo livre… ainda estou para fazer o gráfico! Sim, o rapaz é afinado. Não fosse o segundo propósito/compromisso que quero partilhar convosco: esquecer o horário e compromissos um dia, uma vez por semana. Realmente, tanto trabalho, tanta planificação para no fim de contas chegarmos a isto. Não estou a brincar nem convosco, nem comigo. Explico: não posso deixar que um pedaço de papel, ou meia dúzia de folhas controlem a minha vida. Não sou escravo da planificação. E antes que lhe prometa fidelidade inviolável, vale mais deixar já claro que há um ponto de fuga. Só uma vez por semana. Outra vez por semana quero desligar-me do telemóvel e outros meios de comunicação afins, tipo, vulgo, internet. E depois a seguir queixar-me e ouvir as queixas dos meus amigos e amigas que dizem: mas olha lá, ainda és vivo? ‘tás mesmo no fim do mundo, nem o telemóvel atendes!!! Para que te mando eu mail’s? ou esta mais engraçada: quando precisares depois eu cá estou! Mudando de ritmo, uma vez por mês, quero fazer um passeio. Sem mais nada, sem nenhum objectivo concreto, ao sabor do tempo e das rodas do carro. Estejam atentos à estrada, quem sabe não apareço diante de vós, ou desviem-se, quem sabe não tenho tempo de travar!!! Esta é mesmo de rir, mas quero cumpri-la a sério, como pessoa séria e empenhada no meu bem-estar: uma manhã de desporto por semana… Depois há os propósitos de leitura e escrita. Ao menos um livro por mês e andar sempre com um caderno para alimentar as linhas de poesia que de vez em quando me lembro. Tantas vezes hei-de lançar olhares em verso, que certo dia algum há-de ser perfeito. Também quero actualizar mais vezes este blog, no mínimo duas vezes por mês.

Até parecia mal se não falasse do acontecimento que hoje marca o dia. Cá no sítio, idosos e crianças vieram encontrar-se com o menino Jesus no presépio. Como nesse tal acontecimento, estes reis trouxeram-lhe presentes. Até se ouviu um balido inocente de um cordeiro negro ao colo de um actuante pastor. E Jesus voltou de novo a manifestar-se a todos os povos como a Salvação de Deus. Já pela manhã tinha dito a pequenos e não tão pequenos quais eram os presentes que os do Oriente tinham ofertado ao menino Jesus. Ouro, incenso e mirra. E expliquei: hoje cabe-nos a nós oferecer-Lhe a mirra de sermos verdadeiras imagens de Deus, homens e mulheres criados como Ele nos quis (por vezes custa tanto aceitar isto, e vê-se cada coisa…); o nosso incenso é sermos capazes de ouvir Deus que nos quer falar, e falarmos com Ele, aquilo a que chamamos oração; e o ouro… esse teve várias tentativas de definição, mas eu sugiro uma própria: oferecermos-lhe a nossa vontade, afinal é essa mesmo que Deus precisa para fazer em nós maravilhas.

Resta dormir e esperar que amanhã seja outro dia assim: frio, quente, nevoeiro, luz, sombras, planos, viagens, conversas, aulas, reis, negros cordeiros, ouro, incenso e mirra. Amén.