Começamos a existir Naquele Sonho que faz realidade todos os outros, derramando o Seu amor, através do amor de dois seres humanos, e, no milagre da vida, descobri-mo-nos capazes de pensar, de amar, de chorar, mas também de sorrir. Misturando este sonho, agitado pela vida, assim pensamos... e do pensar a letra se faz, e da Palavra se recomeça de novo, como na Origem.

10 junho 2010

Um olhar diferente...

Um dia um homem muito importante, e que aos olhos de Deus tinha sido tornado grande. Tinha tudo e mais ainda do que o necessário. Não contente com isso, esse homem desejou a única coisa que não lhe pertencia. O nome do homem era David, o que não lhe pertencia era a mulher do próximo. A fraqueza está presente nas nossas vidas. Seja como David, ou como a escritura narra, desde Adão, passando pela história que hoje narra o Evangelho e por tantas outras, que são inclusive as nossas. À mesa, como convidado, Jesus está certamente reclinado, como era habitual fazer-se no tempo. No fim dos banquetes, numa sociedade com os seus problemas, prostitutas procuravam os seus clientes, porventura já embriagados. Todos sabiam o motivo pelo qual essas mulheres rondavam as mesas dos festins. O julgamento do fariseu Simão foi imediato. Se o seu convidado fosse profeta já saberia quem era a mulher e o que queria dele. Mas a mulher tem uma atitude que surpreende. Procurava hoje um cliente diferente, para um outro encontro. Ela trouxe um frasco de perfume, e sem ousar pôr-se à frente de Jesus, chorando, lava os pés de Jesus e utiliza para os secar uma toalha, no mínimo invulgar, os seus cabelos. Beijava-os e ungia-os com perfume. Jesus tem um problema maior para resolver antes de se dirigir àquela mulher. Tem que resolver o dilema no coração do seu anfitrião. Nova história. Se um homem tendo dois devedores, e um lhe devesse mais do que o outro, e por não terem com que pagar, perdoa a ambos, qual devia ser o mais agradecido? Até nós daríamos a mesma resposta de Simão. No que toca a problemas de dinheiro, somos todos peritos. A quem mais foi perdoado, mais agradecido deve ficar. Mas, mudando a realidade, e tratando de coisas bem mais importantes que o dinheiro, de uma pessoa, seja da mulher pecadora, seja de David, ou de tantos irmãos nossos, a nossa resposta não seria a mesma.
O olhar de Jesus é diferente. Não se apressa a julgar os comportamentos da mulher. E no meio daquelas lágrimas e de beijos, Jesus vê amor e arrependimento. Afinal o Profeta de Deus não vinha trazer mais moralismos vazios, mas antes compaixão. Jesus prefere reconhecer nela uma mulher que se sabe amada e perdoada por Deus. Por isso deixa-se tocar e amar por ela. Oferece-lhe o perdão de Deus.  Ajuda-a a encontrar dentro de si própria a fé que a salva e que a deixa viver, dai em diante, em paz. Por isso afirma Paulo que não é pelas obras da Lei que o homem se torna justo, mas pela fé em Cristo Jesus. Por isso é que todos nós acreditámos em Jesus, a fim de vivermos para Deus. E viver para Deus é viver como Jesus viveu, fazendo do olhar dele o nosso olhar, da sua compaixão a nossa, do seu perdão o nosso, do seu amor, o nosso. E depois como diz Paulo, já não sou eu que vivo, mas é Cristo que vive em mim. E se vivemos ainda marcados pela nossa fraqueza, vivemos animados pela fé no Filho de Deus que nos amou e se entregou por nós, para que Cristo não tenha morrido em vão.
Hoje, no meio de nós, não fazem falta muitas palavras. Apontar os outros, porventura como o fariseu no Evangelho, mesmo no nosso coração, é sempre mais fácil do que acolhê-los, amá-los e mostrar-lhes o perdão de Deus. Foi assim que Jesus fez, e é assim que Ele quer continuar a fazer, através de nós. Ele é mestre e senhor. Mas se ele não se limitou a ensinar, mas a ser profeta da compaixão de Deus, então nós temos de seguir-lhe o exemplo. Temos de ser cristãos capazes de olhar para os marginalizados, os transviados, aqueles que ninguém quer por perto, com os olhos de Jesus. Felizes aqueles que têm já na sua vida esta opção. Sejamos nós capazes de tomar esta opção, afinal a de Jesus, e a de tantos santos e santas, doutros tempos e do nosso, para estar juntos de quantos precisam de quem defenda a sua dignidade, e desperte a sua fé no Deus que a todos nos ama, entende e perdoa, como nós não somos capazes de fazer. Não há outra forma de perdoar os nossos próprios pecados. O próprio Jesus é quem nos diz: «São-lhe perdoados os seus muitos pecados, porque muito amou; mas aquele a quem pouco se perdoa, pouco ama». A todos nós muito foi perdoado, porque esperamos para amar mais ainda?

06 junho 2010

Hoje em mim!!! 24

Continuo a ser um pensador, às vezes dormindo, outras vezes acordado. Capaz de sonhar, viver e amar, porque outros amaram por mim, e me fizeram acreditar que o pensamento é a expressão da liberdade dos que Ele criou.

Hoje com mais um ano de vida, agradeço-Lhe tudo o que me concede. Vale a pena lutar por ser feliz!

05 junho 2010

Eu te ordeno, levanta-te!


Apetece-me começar com uma pergunta: depois de vivernos o Tempo Pascal, que terminou com o Pentecostes, depois do Domingo da Santíssima Trindade, e até do Dom do Corpo e do Sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo, como é que na vida do dia-a-dia descobrimos a presença de Deus?  Em que é o que celebrámos na fé, adiantou para a nossa vida de hoje?
A maneira de perceber Deus e a própria vida foi variando ao longo dos tempos. Disso mesmo dá testemunho a Palavra de Deus. Por um lado, perceberemos nós Deus presente nas nossas vidas? Questionando-O, e à sua forma de proceder, até duvidando Dele, e daqueles que Ele coloca no nosso caminho? É o que acontecia hoje na primeira leitura. Uma mãe questiona um homem. Viria ele lembrar-lhe os seus pecados? Seria a morte do filho seria culpa dele? E, então, Elias, assim se chamava o homem, intercede diante de Deus por aquela pobre mulher, viúva, e pelo seu filho entretanto morto. Por outro lado, será que às vezes nos esquecemos que é possível que seja o próprio Deus a vir ao nosso encontro? Disso dá testemunho o Evangelho. Jesus olha para a mulher e já não tem necessidade que ninguém interceda por ela e por seu filho morto. Ele próprio olha para ela, compadece-se e diz-lhe cheio de compaixão: Não chores! O novo profeta já não tem necessidade de se dirigir por três vezes a Deus, mas, porque Ele próprio é Deus, ordena ao jovem que se levante. Imediatamente ele se levanta e começa a falar. Num e no outro caso é motivo para que se dê glória a Deus. Porque Deus visita o seu povo, Deus salva o seu povo.
Em Jesus Cristo Deus vem ao nosso encontro, para ser nosso alimento, para se fazer caminhante connosco, pelas estradas da vida. Não admira que este Deus surpreenda e contrarie as intenções de Paulo, como escutávamos na II leitura. Ele predestina-nos desde o seio materno, chama-nos pela sua graça, para revelar em nós Jesus Cristo, a fim de que nós demos testemunho e O anunciemos. Como dirá S. João, nisto conhecemos o amor de Deus para connosco, não fomos nós que O amámos, mas foi Ele que nos amou primeiro. Quando éramos injustos, um só morreu por nós.
Este Deus que é Família, que é Trindade, que Se aproxima livremente de nós, apenas por amor, não se limita a dar-se-nos a conhecer, e a revelar-Se como amor, mas quer que nós entremos nesta comunhão, neste diálogo, que só pode ser de amor. Como Paulo deixamos de consultar a carne e o sangue, para passarmos a responder a este convite do Deus Amante, que através da nossa própria vida Se nos vai dando a conhecer. Geralmente é nos momentos baixos, que Ele Se nos mostra: com toda a sua força, a palavra de Deus hoje escolhe precisamente a negação da vida, a morte, como manifestação de Deus, isto é, onde parece estar o aparente absurdo. As situações semelhantes de duas viúvas, aquelas que mereciam mais compaixão segundo o judaísmo, por simbolizarem a extrema pobreza, que perdem os seus filhos únicos, o que lhes restava, são motivo para que Deus intervenha. De forma diferente, ora por intermediários, por profetas, ora fazendo-Se Ele mesmo o grande profeta, Deus salva os seus fiéis, porque a Sua benevolência dura a vida inteira, porque no amanhecer volta a alegria, Ele é o nosso auxílio, Aquele que converte em júbilo o nosso pranto, e nos dá motivo para que O louvemos eternamente.  
Não há maior convite ao amor do que experimentar previamente o Amor, dirá mais tarde S. Agostinho. De facto o convite hoje mantém-se, Ele dirige-se a nós, não para nos pedir contas dos nossos pecados, não para nos causar desgraças, não para nos pedir o impossível, não para nos deixar sem nada, mas para olhar para a nossa miséria, para se compadecer de nós, para limpar do nosso rosto as lágrimas e nos fazer de novo levantar: numa palavra para nos amar. Na multidão poderemos estar certos que Jesus dirige o seu olhar para cada um de nós, para a nossa vida, e à Sua palavra, a vida ganha um novo sentido. Já não estamos sós, Deus está connosco. E a nossa vida recobra forças, recobra a esperança.
Em cada Eucaristia, uma vez mais, seremos convidados a olhar para a Sua entrega por nós. Deixemos que Ele se faça nosso alimento, e com Ele celebremos o banquete do festim de Deus para nós, o verdadeiro sentido da nossa vida e da nossa existência. É à nossa porta que Ele bate para entrar. É Ele que tem palavras de vida eterna. Deixemos hoje uma vez mais que, na nossa vida, seja Ele a voz que ecoa no meio da multidão: Eu estou contigo para te salvar! Eu estou contigo porque te amo. Eu te ordeno, Levanta-Te!