Começamos a existir Naquele Sonho que faz realidade todos os outros, derramando o Seu amor, através do amor de dois seres humanos, e, no milagre da vida, descobri-mo-nos capazes de pensar, de amar, de chorar, mas também de sorrir. Misturando este sonho, agitado pela vida, assim pensamos... e do pensar a letra se faz, e da Palavra se recomeça de novo, como na Origem.

05 junho 2010

Eu te ordeno, levanta-te!


Apetece-me começar com uma pergunta: depois de vivernos o Tempo Pascal, que terminou com o Pentecostes, depois do Domingo da Santíssima Trindade, e até do Dom do Corpo e do Sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo, como é que na vida do dia-a-dia descobrimos a presença de Deus?  Em que é o que celebrámos na fé, adiantou para a nossa vida de hoje?
A maneira de perceber Deus e a própria vida foi variando ao longo dos tempos. Disso mesmo dá testemunho a Palavra de Deus. Por um lado, perceberemos nós Deus presente nas nossas vidas? Questionando-O, e à sua forma de proceder, até duvidando Dele, e daqueles que Ele coloca no nosso caminho? É o que acontecia hoje na primeira leitura. Uma mãe questiona um homem. Viria ele lembrar-lhe os seus pecados? Seria a morte do filho seria culpa dele? E, então, Elias, assim se chamava o homem, intercede diante de Deus por aquela pobre mulher, viúva, e pelo seu filho entretanto morto. Por outro lado, será que às vezes nos esquecemos que é possível que seja o próprio Deus a vir ao nosso encontro? Disso dá testemunho o Evangelho. Jesus olha para a mulher e já não tem necessidade que ninguém interceda por ela e por seu filho morto. Ele próprio olha para ela, compadece-se e diz-lhe cheio de compaixão: Não chores! O novo profeta já não tem necessidade de se dirigir por três vezes a Deus, mas, porque Ele próprio é Deus, ordena ao jovem que se levante. Imediatamente ele se levanta e começa a falar. Num e no outro caso é motivo para que se dê glória a Deus. Porque Deus visita o seu povo, Deus salva o seu povo.
Em Jesus Cristo Deus vem ao nosso encontro, para ser nosso alimento, para se fazer caminhante connosco, pelas estradas da vida. Não admira que este Deus surpreenda e contrarie as intenções de Paulo, como escutávamos na II leitura. Ele predestina-nos desde o seio materno, chama-nos pela sua graça, para revelar em nós Jesus Cristo, a fim de que nós demos testemunho e O anunciemos. Como dirá S. João, nisto conhecemos o amor de Deus para connosco, não fomos nós que O amámos, mas foi Ele que nos amou primeiro. Quando éramos injustos, um só morreu por nós.
Este Deus que é Família, que é Trindade, que Se aproxima livremente de nós, apenas por amor, não se limita a dar-se-nos a conhecer, e a revelar-Se como amor, mas quer que nós entremos nesta comunhão, neste diálogo, que só pode ser de amor. Como Paulo deixamos de consultar a carne e o sangue, para passarmos a responder a este convite do Deus Amante, que através da nossa própria vida Se nos vai dando a conhecer. Geralmente é nos momentos baixos, que Ele Se nos mostra: com toda a sua força, a palavra de Deus hoje escolhe precisamente a negação da vida, a morte, como manifestação de Deus, isto é, onde parece estar o aparente absurdo. As situações semelhantes de duas viúvas, aquelas que mereciam mais compaixão segundo o judaísmo, por simbolizarem a extrema pobreza, que perdem os seus filhos únicos, o que lhes restava, são motivo para que Deus intervenha. De forma diferente, ora por intermediários, por profetas, ora fazendo-Se Ele mesmo o grande profeta, Deus salva os seus fiéis, porque a Sua benevolência dura a vida inteira, porque no amanhecer volta a alegria, Ele é o nosso auxílio, Aquele que converte em júbilo o nosso pranto, e nos dá motivo para que O louvemos eternamente.  
Não há maior convite ao amor do que experimentar previamente o Amor, dirá mais tarde S. Agostinho. De facto o convite hoje mantém-se, Ele dirige-se a nós, não para nos pedir contas dos nossos pecados, não para nos causar desgraças, não para nos pedir o impossível, não para nos deixar sem nada, mas para olhar para a nossa miséria, para se compadecer de nós, para limpar do nosso rosto as lágrimas e nos fazer de novo levantar: numa palavra para nos amar. Na multidão poderemos estar certos que Jesus dirige o seu olhar para cada um de nós, para a nossa vida, e à Sua palavra, a vida ganha um novo sentido. Já não estamos sós, Deus está connosco. E a nossa vida recobra forças, recobra a esperança.
Em cada Eucaristia, uma vez mais, seremos convidados a olhar para a Sua entrega por nós. Deixemos que Ele se faça nosso alimento, e com Ele celebremos o banquete do festim de Deus para nós, o verdadeiro sentido da nossa vida e da nossa existência. É à nossa porta que Ele bate para entrar. É Ele que tem palavras de vida eterna. Deixemos hoje uma vez mais que, na nossa vida, seja Ele a voz que ecoa no meio da multidão: Eu estou contigo para te salvar! Eu estou contigo porque te amo. Eu te ordeno, Levanta-Te!

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